18 de dezembro de 2017


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Um dos pontos mais polêmicos da Reforma Trabalhista, a obrigação dos trabalhadores pobres de pagarem os custos advocatícios e de perícia dos processos movidos contra os empregadores em caso de derrota está sendo propositadamente ignorada por magistrados da Justiça do Trabalho.

Apesar de ainda não haver estatísticas consolidadas a respeito, juízes e desembargadores de diversos estados da federação ouvidos pelo blog afirmam que a maioria de seus colegas segue à luz da regra antiga, quando os mais pobres tinham direito à gratuidade. A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) tem afirmado que considera a mudança inconstitucional, pois reduz o acesso dos mais vulneráveis a seus direitos.

Desde que a Reforma Trabalhista passou a valer no mês passado, pipocam notícias e reportagens mostrando que juízes passaram a cobrar dos trabalhadores os custos advocatícios e de perícias quando perde a ação. Cobranças que ultrapassam R$ 60 mil contra trabalhadores que perdem ações têm assustado trabalhadores.

”Quando um cachorro abana o rabo, não é notícia. Quando o rabo abana um cachorro, é. Ou seja, essas decisões só ganharam visibilidade porque estão fora do padrão. Na maioria dos casos, a gratuidade continua”, afirma um desembargador ouvido pelo blog.

Para outro magistrado, isso vem de uma minoria de juízes que usam a imprensa para disseminar a ideia de que a Justiça do Trabalho acatou a mudança, adotando uma espécie de ”fascismo judiciário”. Atesta que, no seu caso, proferiu, desde então, 50 decisões, entre as quais sentenças desfavoráveis aos trabalhadores, mas em nenhuma delas os obrigou ao pagamento das custas do processo.

A justificativa para obrigar o pagamento é a redução no número de processos. O problema é que o caminho escolhido para diminuir o número de ações desnecessárias ou de má fé foi tirar direitos da massa de trabalhadores pobres.

Vale ressaltar que o item ”Rescisão do Contrato de Trabalho e Verbas Rescisórias” representou 11,51% do total de processos ingressados em todo o sistema de Justiça em 2016, sendo novamente o assunto mais recorrente no Poder Judiciário brasileiro. No total, foram 5.847.967 de novos processos, enquanto, em 2015, o número ficou em 4.980.359 (11,75%). Os dados fazem parte do Relatório Justiça em Números 2017 (ano-base 2016), divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Verbas rescisórias não pagas ou pagas em valor menor do que o estipulado legalmente após uma demissão dizem respeito não apenas a salários, mas também a outros direitos, como aqueles previstos no artigo 7o da Constituição Federal, tais como aviso prévio, férias e adicional de férias, 13o salário, FGTS.

Um dos juízes do Trabalho ouvidos pelo blog traz seus números para mostrar que, em sua opinião, a cobrança em caso de derrota não alterou o fluxo de novas ações – ao contrário do que afirmam algumas análises. Ele recebia uma média de 5,45 novas ações por dia. Na semana anterior ao dia 11 de novembro, quando a reforma passou a valer, recebeu uma média de 15 processos/dia. E, depois disso, 3,23/dia. Segundo ele, grandes escritórios de advocacia ”limparam suas gavetas”, ajuizando ações antes que a Reforma Trabalhista passasse a valer. O número, agora, teria voltado ao que ele chama de normal.

Há magistrados que usam a nova regra para novos processos apenas, outros para os antigos. E há aqueles que abertamente estão indo contra a Reforma Trabalhista nos pontos em que acreditam ser inconstitucional. Estima-se que leve entre cinco e dez anos para que tenhamos jurisprudência consolidada sobre os mais de 120 pontos alterados na CLT.

Outro magistrado diz que sentiu o mesmo movimento, mas o número não voltou ao que era antes, ficando um pouco abaixo. Em sua opinião, os advogados trabalhistas estão em um momento de tatear o terreno, sentindo como juízes estão interpretando as demandas à luz na nova legislação.

Uma avaliação para entender se a Reforma Trabalhista reduziu de forma significativa o número de processos em trâmite no país não virá até surgirem números consolidados. O mesmo se aplica a afirmar que a negação da gratuidade aos mais pobres emplacou ou empacou. Por enquanto, é possível verificar o termômetro pelo posicionamento de juízes, desembargadores e ministros sobre o tema, bem como o de suas associações. E, pelo visto, a temperatura não agrada àqueles que queriam ver as mudanças aplicadas desde já.

A Procuradoria Geral da República entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, a ADI 5766, contra a mudança feita pelo governo Michel Temer, em parceria com o Congresso Nacional neste ano e apoiada pelo mercado financeiro e grandes associações empresariais. Segundo a ação, ”com o declarado objetivo de reduzir o número de demandas, a legislação avançou sobre garantias processuais e violou direito fundamental dos trabalhadores pobres à gratuidade judiciária”. A ADI está sob responsabilidade do ministro Roberto Barroso.

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